Entenda tudo sobre a paisagem urbana e a educação ambiental! Descubra agora nesse artigo feito pelo professor da AgroPós!
O advento da industrialização dividiu a história da humanidade praticamente em todas as áreas do conhecimento, mas em nenhuma outra esse fato foi mais sentido do que no processo de urbanização. Após a industrialização a população urbana começou a crescer, atingindo níveis alarmantes.
De modo geral, fala-se, hoje, que mais de 50% da população vivem em cidades; se a cidade tem uma economia mais industrializada que agrícola esse índice pode chegar a 80%.
Isto, é claro, influencia diretamente na qualidade de vida. Para melhorar a vida urbana, o lazer e a estética são elementos essenciais, funcionando tanto fisiológica quanto psicologicamente. Assim, a vegetação urbana, quer seja em forma de praças, quer seja em forma de arborização, quer seja em forma de quintais verdes, passa a ter um papel relevante.
As florestas urbanas:
Quando se detectou a necessidade de áreas verdes nas cidades, os esforços foram envidados para áreas verdes e de lazer e para a criação de espaços públicos; sempre pensando em áreas bidimensionais.
Em Paris, no século passado, o Barão Haussmann inovou com a abertura de avenidas e bulevares onde o plantio de árvores de forma linear, enfileiradas ao longo das calçadas, inaugurou o modelo de arborização urbana, hoje adotado em praticamente todas as cidades. Esse modelo prioriza o senso estético, buscando tornar as cidades mais bonitas, mais coloridas.
Modernamente, a preocupação com a ecologia e com a qualidade de vida tem levado os arboricultores a buscar um novo conceito para a arborização urbana.
Ecologicamente, árvores agrupadas contribuem mais para a melhoria climática que árvores enfileiradas e o conceito de arborização urbana evoluiu para o de florestas urbanas onde o “stand” passa a ser mais importante que o indivíduo arbóreo isoladamente.
Nesse sentido, revestem-se de grande importância as árvores das praças, dos parques municipais e, principalmente, dos quintais.
Estética e qualidade devida:
Inegavelmente a estética é um fator importantíssimo na paisagem urbana, principalmente sob o ponto de vista psicológico.
A vegetação urbana contribui para a harmonia da paisagem quebrando a dureza e a rigidez do concreto, criando linhas mais suaves e naturais e lembrando um pouco a paisagem bucólica, início natural de todo citadino.
Mas, se durante muito tempo se plantou árvores nas cidades com essa finalidade, hoje o fazemos por diversos outros motivos, mais importantes às vezes que o simples valor estético.
Amenização climática:
Quando se diz que o vegetal na paisagem urbana promove uma mudança de clima não se quer dizer que transformaremos o clima de uma cidade como Ubá, por exemplo, no clima de uma Campos do Jordão. Entretanto, podemos criar ilhas de amenização com o uso de vegetais, contrapondo-se às ilhas de calor criadas pelo concreto e pelo asfalto.
O vegetal atuará na amenização climática principalmente sobre três aspectos:
- 1) interceptando os raios solares, criando áreas de sombra onde as pessoas se sentem mais à vontade e onde os carros possam ser mantidos mais frescos;
- 2) reduzindo a temperatura ambiente, evitando a incidência direta e consequente reflexo do calor provocado pelo aquecimento do concreto e do asfalto;
- 3) umidificando o ar devido à constante transpiração, eliminando água para o meio ambiente.
Controle hidrológico:
A água que cai sobre a cidade se dissipa de várias maneiras: parte dela retorna ao ar pela evapotranspiração; parte se infiltra no solo profundamente indo abastecer os lençóis de água do solo; parte se infiltra superficialmente abastecendo as plantas e umedecendo o solo superficial e outra parte escorre por sobre a superfície do solo.
A parte que evapotranspira é importante porque vai perpetuar o ciclo da água, fazendo chover; as partes que irão para o interior do solo abastecem os rios, as represas, as nascentes e fazem crescer os vegetais; a parte que escorre sobre o solo, se é pequena, não prejudica, mas, se é intensa, causa erosões, deslizamentos, enchentes e empobrecimento do solo.
Nos solos cobertos naturalmente com vegetação ocorre muita evapotranspiração, muita infiltração e pouco escoamento superficial. Nos solos das cidades onde a vegetação foi substituída por construções e o solo foi impermeabilizado pelo cimento e pelo asfalto não existe quase nada de transpiração (embora exista evaporação), a água não se infiltra e o escoamento superficial é intenso, ou seja, quase toda a água escorre pelas ruas.
Se o sistema de drenagem da cidade (bocas-de-lobo, galerias pluviais) não funciona, toda essa água ficará parada nas partes baixas da cidade. Essa é a razão pela qual bastam poucos minutos de chuva intensa para que cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte fiquem interditadas. Assim, uma cidade bem arborizada garantirá um ciclo hidrológico natural, sem problemas.
Purificação do ar:
Afastando de cara a ideia do vegetal terrestre como fonte de oxigênio, pois hoje sabemos que sua contribuição é pequena (a oxigenação significativa vem do mar), podemos defender, no entanto, o uso da arborização urbana como controladora das condições do nosso ar urbano pelo menos de quatro maneiras:
- 1) as árvores podem funcionar como filtros em que as partículas sólidas presentes no ar (poeiras) se aderem às folhas podendo ser lavadas posteriormente pelas águas das chuvas;
- 2) a produção de oxigênio pelas árvores, embora pequena, se misturará ao ar da cidade e, de certa forma, diluirá o ar poluído circundante;
- 3) a árvore fará uma troca com o ar da cidade já que ela pegará o gás carbônico e emitirá o oxigênio e;
- 4) a árvore fixará em seus tecidos pelo menos parte dos componentes nocivos presentes no ar atmosférico das cidades. Estudos científicos têm demonstrado essas atuações do vegetal na despoluição atmosférica. No entanto, plantar árvores com a intenção de que elas venham a resolver o problema da poluição atmosférica urbana é esperar muito de um ser tão sensível e tão frágil.
Humanização:
Essa talvez seja a maior contribuição das árvores para a urbanização. O crescimento desordenado das cidades gera condições de vida subumanas, estresse, violência, enclausuramento. O vegetal atua então, psicologicamente, trazendo à lembrança as paisagens da infância vividas no meio rural, onde tudo era natural, cercado de vegetação por todos os lados.
Fisiologicamente isso se materializará no banco da praça mais próxima, sob uma frondosa árvore, onde a sombra é mais gostosa; se materializará no canto dos pássaros atraídos pelos frutos das árvores da praça ou da rua, talvez em frente à casa, bem ao lado da janela, onde ele virá cantar todas as manhãs; na referência urbana, caracterizada, talvez, pela floração da árvore postada bem no caminho do serviço ou no ponto do ônibus, avisando a chegada da primavera.
Por mais que o homem seja criativo no traçado das cidades e na construção de casas diferentes, as cidades tendem a se tornar todas iguais.
A vegetação é um marco diferenciador das cidades. É ela que referencia e que caracteriza. Bastam-nos lembrar, como exemplos, cidades conhecidas por suas palmeiras, por suas cerejeiras ou por seus jacarandás.
Política de arborização na paisagem urbana:
Grande parte dos trabalhos desenvolvidos pelos arboricultores na paisagem urbana, hoje, é consertar o que há de errado. A falta de um planejamento e mesmo a falta de conhecimento, levou os primeiros arboricultores ao plantio de espécies inadequadas para os sítios urbanos. O pior é que ainda se pratica muito desse erro.
Muito desse erro se deve a atitudes políticas tanto a partidária quanto a ecológica. No afã de resolver problemas ambientais e melhorar a qualidade de vida urbana, toma-se como prática corriqueira a distribuição de mudas para plantios na cidade.
Na maioria das vezes essa distribuição não é acompanhada de uma orientação e, novamente, as espécies inadequadas voltam a ocupar locais inadequados.
Assim, recomenda-se que a política de arborização para uma cidade seja acompanhada de uma orientação técnica e que se evite a distribuição aleatória de mudas, mormente as praticadas em ocasiões comemorativas como Semana do Meio Ambiente, Dia da Árvore, etc.
Educação ambiental com as árvores na paisagem urbana
Sabemos que a Educação Ambiental se faz cada vez mais necessária. Também sabemos que nossos alunos precisam de prática ao invés da absorção de conhecimentos apenas de modo teórico.
Assim, a saída da sala de aula, por si só, já é um grande incentivo ao aprendizado. Entretanto, viagens longas, muitas vezes, se fazem impossíveis.
A arborização urbana permite aulas de educação ambiental sem que o professor precise se deslocar com a turma para muito longe. Seguramente, no entorno da escola existirá material disponível para o aprendizado, como se verá.
A necessidade de planejamento:
Embora a cidade seja o local escolhido pela maioria para o estabelecimento da residência, a cidade é um ambiente hostil em termos ecológicos. DIAS (1993), já citando BOYDEN et al. (1981), compara a cidade a um grande animal sedentário que só consome, produzindo pouco e, mesmo assim, do que produz grande parte é nociva ao meio ambiente como água poluída e lixo, por exemplo.
Para contrapor esses malefícios e melhorar o ambiente urbano, a vegetação é um elemento importantíssimo tanto na forma de áreas verdes como na forma de arborização, mesmo que isoladamente.
Se no início a árvore foi utilizada como mero adorno, hoje ela desempenha diversas outras funções para a qualidade de vida urbana.
Mas a árvore não só traz benefícios, e os transtornos podem ser muitos se a arborização urbana não tiver sido bem planejada. Para citar apenas alguns, podemos lembrar: a quebra de calçadas pelo desenvolvimento de raízes superficiais; o conflito com a rede de distribuição de energia e com a iluminação pública; a queda sobre carros e pedestres em acidentes causados por ventos e tempestades.
Assim é que, ao planejara a arborização de uma cidade, o técnico tem de ter bons conhecimentos sobre as espécies florestais e sobre as condições locais onde será plantada a árvore. Das condições locais podemos citar, por exemplo, a largura de ruas e calçadas, a presença de fiações, a presença de redes subterrâneas como água e esgoto.
Sobre as espécies é importante conhecer, por exemplo, o porte alcançado pela árvore quando adulta, como se dá o desenvolvimento de suas raízes, o tipo de fruto que ela produz.
O envolvimento comunitário:
Como visto, a arborização de uma cidade deve ser feita segundo um planejamento rigoroso para evitar os malefícios e realçar os benefícios. Por outro lado, sabemos que, por mais que o poder público tenha boa intenção quanto à arborização, esta poderá ser considerado entrave na medida em que a população não gostar do serviço realizado pela prefeitura.
Por essa razão, recomenda-se que o planejamento e a implantação da arborização sejam feitos, na medida do possível, com a participação da comunidade.
O envolvimento da comunidade tem, pelo menos, duas justificativas conforme apresentadas por PAIVA e GONÇALVES (2002): primeiro, porque a administração pública não pode arcar sozinha com todas as despesas; segundo, porque o plantio comunitário estabelece um vínculo entre a população e a arborização, e a adoção da árvore como um membro da família tem demonstrado que esse processo estabelece uma dependência e uma continuidade que vão além dos partidos e dos mandatos políticos.
O processo educativo:
“A participação comunitária no processo de arborização de um bairro ou de uma cidade constitui um ato de cidadania e, por si só, um processo de educação ambiental” (PAIVA e GONÇALVES, 2002). Para o caso da educação formal, que é o foco principal deste artigo, sugerimos algumas atitudes ao professorado de primeiro e segundo graus para serem desenvolvidos com os alunos nas proximidades da escola:
1 – Para familiarização com as espécies mais comuns utilizadas na arborização urbana, o professor deverá fazer visitas prévias, sozinho ou acompanhado por técnicos da prefeitura, procurando reconhecer as árvores dos arredores da escola. Um bom material de ajuda são os guias ou manuais de arborização editados pelas companhias distribuidoras de energia elétrica, como a página que apresentamos a seguir, extraída do manual da CEMIG. Esses manuais costumam ser distribuídos gratuitamente pelas companhias. Quando estiver familiarizado com as espécies e com as árvores, o professor poderá levar os alunos para conhecê-las. Desse conhecimento pode derivar diversas atividades como, por exemplo:
- eleição da árvore mais bonita;
- exercício de redação sobre a visita e conhecimento das árvores;
- concurso de desenho que capte as características da árvore que o aluno tenha gostado mais.
Exemplo de página de manual para identificação de árvores. Fonte: CEMIG (1996)
2 – Numa segunda visita, o professor poderá abordar com os alunos sobre os tratos dispensados às árvores como a poda, por exemplo. Novamente recomendamos ao professor um estudo sobre as maneiras corretas de se podar uma árvore e que podem ser vistas nos manuais, como as que extraímos do manual da ELETROPAULO, apresentadas a seguir. Os alunos observarão as árvores e apontarão as que estejam danificadas, quem sabe por inépcia do podador. Atividades ou perguntas que podem ser direcionadas aos alunos:
- houve necessidade realmente da poda?
- a poda foi bem feita? poderia ser evitada?
- será que a árvore está plantada no lugar certo?
Normas para uma poda correta. Fonte: ELETROPAULO (1995).
Página mostrando aspectos de árvores podadas. Fonte: ELETROPAULO (1995)
3 – Em outra visita, ou, melhor ainda, em visitas sucessivas, o professor poderá solicitar do aluno a observação dos aspectos fenológicos. A fenologia diz respeito às mudanças pelas quais passa o vegetal conforme os meses ou as estações do ano, apresentadas no seu aspecto geral. Assim, por exemplo:
- pedir aos alunos para recolherem flores, folhas e frutos;
- observar presença ou ausência de perfumes;
- recolher frutos (se houver); observar, pesar e medir;
- desenhar, identificar, provar.
4 – Em outra visita, de preferência no verão, em dias bem quentes, sair com a turma levando pelo menos dois termômetros ou outros aparelhos de fácil leitura e observar, por exemplo:
- a temperatura sob a árvore e a temperatura sob o sol;
- a temperatura sob a árvore e a temperatura sob uma marquise;
- comparar, construir relatórios, explicar as diferenças.
5 – Fazer uma leitura prévia do Código Florestal e depois levar os alunos para observarem uma ocupação indevida de encostas com riscos de deslizamento. Mostrar aos alunos as bocas-de-lobo das ruas para recolhimento das águas de chuva. Instigar as discussões, perguntando, por exemplo:
- pela declividade do terreno, este não deveria ser um local vegetado?;
- será que as bocas-de-lobo são suficientes para o escoamento da água de chuva?;
- quantificar a presença de lixo nas bocas-de-lobo;
- na sala de aula, mostrar fotos das tragédias advindas dessa falta de planejamento.
6 – Levar os alunos para observarem a presença de fauna nas árvores urbanas, principalmente aves e insetos. Perguntar, por exemplo:
- que árvores são preferidas por quais pássaros?;
- em que árvores foram vistos certos tipos de insetos?;
- tentar estabelecer algum tipo de correlação como, por exemplo, preferência por certos frutos.
7 – Pedir aos alunos que coletem folhas de árvores em determinados trechos da cidade. A observação detalhada dessas folhas mostrará elementos diferentes aderidos a elas. Perguntar, por exemplo:
- que relação tem esses elementos encontrados com o entorno?;
- por que certas folhas apresentam mais poeira que outras?;
- tentar identificar o elemento aderida à folha.
8 – Pedir aos alunos para fazerem uma pequena coleção de frutos e de sementes das árvores mais próximas da escola. Perguntar, por exemplo:
- que frutos são preferidos pelos pássaros?;
- quais podem ser consumidos pelo homem?;
- medir, pesar, descrever, desenhar;
- discutir conveniência e inconveniências de frutos secos, carnosos, grandes e pequenos.
9 – Fazer uma explanação prévia sobre toxicidade vegetal. Levar os alunos para a rua e tentar identificar plantas tóxicas e ensinar como e por que evitá-las.
10 – Fazer uma aula de desenho ou de redação sobre a paisagem urbana, pedindo que o aluno desenhe um trecho de rua. Isto pode ser feito com a proximidade da casa do aluno, pedindo-se uma comparação com a proximidade da escola já estudada.
O limite:
Como visto, as possibilidades de uma Educação Ambiental no entorno da escola, utilizando-se da arborização urbana são infinitas. Podemos dizer que o limite é a criatividade do professor.
Bibliografia:
BOYDEN, S. et al. The ecology of a city and its people. Camberra: Australian National University, 1981. 437p.
CEMIG. Manual de arborização. Belo Horizonte: CEMIG, 1996. 40p.
DIAS, G. F. Educação ambiental: princípios e práticas. São Paulo: Gaia, 1993. 400p.
ELETROPAULO. Guia de planejamento e manejo da arborização urbana. São Paulo: Eletropaulo: Cesp: CPFL, 1995. 38p.
PAIVA, H. N. de e GONÇALVES, W. Florestas urbanas: planejamento para melhoria da qualidade de vida. Viçosa; Aprenda Fácil, 2002. 180p.
O texto acima não foi uma palestra. Ele foi originalmente escrito para o livro Florestas Urbanas, publicado pela Aprenda Fácil Editora em 2001, modificado para publicação no livro Educação Ambiental de João Silvestre Rosado em 2008 e adaptado para composição deste trabalho.
Artigo escrito por Wantuelfer Gançalves.